Privatização das docas exigirá modelo diferente para cada porto
A decisão do governo de privatizar as companhias docas, começando pela do Espírito Santo (Codesa), promete gerar calorosas discussões. Especialistas avaliam que para ser bem sucedida a iniciativa precisará atender às especificidades de cada uma das oito companhias docas, que administram portos muito diferentes entre si. Por isso, não haverá “a bala de prata” a ser aplicada verticalmente em todas as administrações.
O sócio da Terrafirma, David Goldberg, entende que há dois tipos de concessão: a cheia, em que o privado assumirá da gestão do condomínio aquaviário à operação de cargas; e a concessão somente da administração. A concessão cheia tende a ser mais viável em portos ainda em crescimento, onde não existem ou há muito poucos arrendatários de terminais (subconcessionários de áreas nos portos públicos). É mais atrativa porque grande parte da receita está na operação. Por outro lado, tende a criar conflitos onde existem muitos terminais arrendados. “Fazer no porto de Santos não funciona. Para portos mais maduros, com muitos arrendamentos, o modelo de concessão somente da administração é mais aplicável”, avalia Goldberg.
A privatização das companhias docas é discutida de tempos em tempos, mas nunca foi enfrentada. A decisão de levar o assunto adiante foi tomada recentemente, depois que o governo conseguiu desenrolar questões mais urgentes, como os terminais de uso privado (TUPs), e lançar arrendamentos. Agora, Brasília avalia haver espaço para abrir essa nova frente.
Uma fonte que acompanha a discussão pontua que os dois modelos de administração já testados na história recente do setor não lograram o êxito esperado. Da criação da agência reguladora do setor, Antaq, em 2001, até a Medida Provisória dos Portos, em 2012, que gerou a nova Lei dos Portos, foram feitas apenas dez licitações de áreas novas em 34 portos públicos, índice muito baixo.
Essa foi uma das razões que levaram o governo a recentralizar o planejamento e as licitações em Brasília. Mas desde a nova lei do setor, de 2013, o sucesso do programa de arrendamentos é considerado relativo. Cinco terminais foram leiloados, a maioria porque os contratos estavam vencidos. Um dos leilões foi revogado (o da Marimex) e houve uma tentativa fracassada (Vila do Conde, em 2015, deu “vazio”). “Talvez seja a hora de deixar o privado fazer”, diz a fonte. Uma questão bastante sensível é o destino da mão de obra das administradoras portuárias. O governo sabe que será um tema espinhoso e quer abrir desde o início o diálogo com os trabalhadores.
O objetivo da privatização é dar mais eficiência aos portos públicos que em geral vêm perdendo espaço para os TUPs. A meta é melhorar não só a logística, mas sobretudo a gestão, eliminando o aparelhamento político e dando mais flexibilidade para compras e contratações de serviços, hoje engessadas pela Lei de Licitações. Outros dois problemas quase unânimes das docas são os passivos trabalhista e financeiro e a falta de recursos para investimentos essenciais como dragagem.
“A pergunta que não quer calar é quem se interessaria por comprar? Não vejo ninguém no mercado. A fonte de receita de uma companhia docas é tarifa pelo fornecimento de infraestrutura e pelo arrendamento. Essa receita teria de cobrir os custos, permitir investimentos e proporcionar margem para o negócio”, diz Fabrizio Pierdomenico, sócio da Agência Porto. Ele, que já trabalhou na Secretaria de Portos, defende um modelo híbrido, em o que o Estado não abre mão de ser o gestor mas os serviços condominiais são licitados.
Wilen Manteli, presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), sustenta há tempos que as docas não são mais administráveis, têm excesso de funcionários, “embora haja técnicos muito bons”, e que a única saída é buscar um novo modelo jurídico de gestão. “Seja concessão ou PPP, ainda que o governo mantenha o controle”. O BNDES deverá definir o modelo de concessão e conduzir os estudos.
Fonte: Valor Econômico.
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